

Ao ser convidada pelo governador Carlos Lacerda
para participar do governo, o sonho de Lota era
criar um Central Park carioca. Sintonizada com o
mundo, ela se entregou de corpo e alma ao pro-
jeto, defendendo, até o final, o desenho com ape-
nas duas pistas para automóveis e fazendo questão
de contratar uma empresa americana para se
encarregar da iluminação feita com postes de 45
metros de altura, de luz de mercúrio. Essa, aliás, foi
uma das inúmeras polêmicas da obra. Burle Marx
a acusou de politicagem e de transformar o lugar
num paliteiro gigante. Os dois, amigos da época
das aulas de pintura com Portinari, acabaram rom-
pendo, com direito a carta aberta de Burle Marx
acusando Lota no jornal O Globo.
Monica Stearns Morse tinha seis anos quando
descerrou a faixa na inauguração do Parque do
Flamengo em 1965. Filha adotiva de Mary Morse –
muito amiga da poeta americana Elizabeth Bishop
e de Lota de Macedo Soares –, lembra de tudo
como se fosse hoje. “Lota me preparou muito para
a cerimônia. Compramos um vestido lindo. Ela e
Elizabeth Bishop foram juntas. Foi um dia inteiro de
recreação, pois o parque foi feito para as crianças.
Palhaços, trenzinho, teatro de marionetes, muita
criança mesmo. Se o Parque existe hoje deve isso a
Lota”, conta Monica.
As polêmicas sumiram no tempo, mas a paisagem
criada por Burle Marx é hoje a maior atração do
parque. A botânica Denise Pinheiro – que participou
do projeto Rio Mar de revitalização do Aterro em
1997 –, destaca a coleção de palmeiras e de figuei-
ras da espécie ficus. “Burle Marx conciliou o dese-
nho artístico do parque com a orla. Era um artista e
contou com o apoio do botânico Luiz Emygdio. Eles
introduziram espécies novas como a Acácia seyal
ou esponjinha-amarela. Trouxeram uma espécie de
Cabo Frio, Pau-jurema, bem escultórica e inovaram
de múltiplas maneiras”, diz Denise.
Ela recomenda apreciar a pata-de-vaca roxa no
trevo do Santos Dumont, a palmeira-leque e o
espetáculo das paineiras-vermelhas, pensado para
lembrar Buda e o conceito religioso de iluminação.
“Burle Marx trazia as sementes e cultivava no sítio
dele. Todo dia tem flor no parque. A abricó-de-
-macaco parece um totem com suas flores. Ela já
existia no Jardim Botânico e, graças a Burle Marx,
foi introduzida pela primeira vez no cenário urbano.
Os ipês-rosa são lindos e, na pista do Flamengo, em
direção a Copacabana, em determinada época
do ano, floresce tudo em
dégradé
, do ipê-
-amarelo à paineira-vermelha, a pata-de-vaca,
sem falar na chichá, uma árvore com flores em
três nuances”, afirma Denise, lembrando da
dedicação da arquiteta Maria Augusta Leão da
Costa Ribeiro, dona Magu, mulher do pintor e
arquiteto Carlos Leão.
O parque também abriga o Monumento aos
Pracinhas (projeto de Marcos Konder Netto e
Hélio Ribas Marinho), assim como algumas
joias ocultas – o coreto de linha leves, o Museu
CarmemMiranda e o Pavilhão Chinês, todos de
Reidy. Posteriormente surgiram o Restaurante
Rio’s (por Marcos Konder) e o complexo da
Marina da Gloria (Índio da Costa). Seu edifício
mais importante é o Museu de Arte Moderna,
também de Reidy.
Infelizmente, desde a última revitalização,
feita em 1997, pouco se fez pelo parque,
segundo Isabela Ono, arquiteta do Escritório
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