

É claro que cada país seguiu o seu caminho literário.
No caso de Portugal, essa trilha se deu pelo mar, que
ocupa um lugar de protagonismo desde as raízes da
sua literatura, no século XII. Nas “cantigas de amigo”,
entoadas pelos trovadores na Idade Média, o mar era o
confidente da mulher que aguardava ansiosa o regresso
do seu amado. Nos séculos XV e XVI, é o lugar por onde
saíam as caravelas para as grandes expedições. Nessa fase,
suas águas representam o desconhecido. “Para a literatura
portuguesa, o mar é a grande metáfora. Ele também
aparece como um símbolo poderoso para poetas mais
recentes, como Ruy Belo e Sophia de Mello Breyner. Álvaro
de Campos, um dos mais conhecidos heterônimos de
Fernando Pessoa, foi engenheiro naval”, conta Luis Maffei,
professor de Literatura Portuguesa da Universidade Federal
Fluminense (UFF).
A onipresença do mar na literatura portuguesa não
é reproduzida pela Espanha, dada as suas dimensões
continentais. A saga de Dom Quixote concentra-se nas
suas andanças pelo interior, na atual região de Castela e
em Zaragoza. Só na segunda parte do livro, lançada em
1615, é que o trio chega a Barcelona e vê o mar pela
primeira vez. Na fase conhecida como o “Século de Ouro
Espanhol”, que abrange o período entre o renascimento
e o barroco, florescem os sonetos e as sátiras de Luís de
Góngora e Francisco de Quevedo. E emergem também
os anti-heróis dos romances picarescos e suas críticas
à nobreza. “O herói picaresco é alguém que vem de
baixo, um subalterno que não está enfrentando uma
crise existencial. Sua meta é matar a fome, custe o
que custar”, explica Iara Kastrup, Mestre em Língua
Espanhola e Respectivas Literaturas pela USP.
Na Península Ibérica, como em todo o mundo, os gêneros
literários têm estreita ligação com seus contextos históricos.
O barroco dos séculos XVII e XVIII é associado a um período
de crise em Portugal que entra em guerra com a Espanha
para recuperar sua autonomia. Nesse contexto, surgem as
Cartas Portuguesas
, escritas pela freira Mariana Alcoforado
para um oficial francês que lutou em solo português. Da
mesma forma que a Geração de 1898, de notáveis poetas
como Antonio Machado, é fruto do declínio do império
espanhol, com a perda de Cuba, Porto Rico e Filipinas.
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